sexta-feira, 27 de novembro de 2015


Raposas, bolor e ácaro

 
A A
O mar de Mariana enlameou meus pássaros e o rumor de meus querubins.
Fez-me descer troncha pela ribanceira chorando amargosa com olhos de fuligem, mofo, bolor e ácaro.
Retorcida, sem planos e saudosa pendi feito flor de mostarda bem ferida.
Não alcancei os armários guardiões de sol, os bolinhos de chuva, as lamparinas com azeite nem as moças limpas.
Avistei as raposas que se disfarçam de pombas e as covas fundas do destrutivismo que as mesmas raposas cavaram.
Avistei também o ladino, o pulha e o falsário hediondando ambições douradas enquanto o xaxim agonizando ajoelhado requeria a água que lhe foi roubada.
Nenhum fio de vida brota. Nenhum grilo invisível canta. Nenhuma garça ou esperança alvora.
Senhor! Não nos abandone às garras do maligno! - Imploro igualmente  Jeremias lamentoso.
O pouco que ainda resta passará por luas muito impossíveis. Cratera exposta, ferida aberta.  Cantiga de morte assobiando sonho que ninguém gosta.
Dor circundada no eito como  escreveu Frantz Fanon: “Todos condenados”.
Terra tentando aprender com as nuvens a arte de se transformar.
Mas nem nuvem há mais, Mariana!  E agora?
Meu coração permanece supuroso, espetado numa estaca de sal.
Corro a vista em Lucas: “É perseverando que vocês obterão vida”.
Crucífera, na amareleza dura de insalubres poças persevero. Zenilda Lua

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Alegre ou triste
Amigo é coisa que eu quero por perto.
Para eles preparo canções,
patê de ricota com folhinhas de manjericão
vinho e pão com azeite fino.
Quando eles vêm arejo a casa
abro as janelas e planto flores
faço uma cortina de palavras 
e revelo segredos.
Aprendo novas coisas
digo que os amo e repito
uma, duas, três, 
quatro vezes.
Amo-os...
Com amor de madureza sem reservas
depois basta fechar os olhos
que a noite me cobre de sonhos.

Poeminha feito sob encomenda pro

sábado, 12 de setembro de 2015

Perdi a conta de quantas vezes fui abordada gentilmente em algumas lojas de flores, no supermercado, no meu trabalho, no calçadão da Rua 7, na Univap. 
Mas antes de ontem foi marcante para as partes. 
O conhecido se aproxima todo animoso e sorridente relata sua estadia fora da cidade. Conta das venturas e dos aprendizados. Das vivências e pendências. Das alegrias e esperanças. No meio dos sorrisos pergunta por ele. Relata que foi ao SESC e não o encontrou. “Foi transferido para outra unidade?”
Eu digo que não. Não foi transferido para outra unidade do SESC, não.
“Voltou pro jardim. Foi ver seus canteiros de ervas perfumadas. 
Foi dar de comer aos rebanhos, foi colher lírio”. 
O amigo de infância tira da carteira o “Álibi” e faz silêncio duradouro. 
O mar realmente desconhece a solidão do navio...
Bom fim de semana para TODOS.
Está tudo lindo, tinindo, brilhando...
Hoje é aniversário do nosso querido Oswaldo Jr.

sexta-feira, 31 de julho de 2015



Disse sim para o que a razão recomenda numa tarde de sábado quando ela me apresentou o desejo de viajar à África do Sul no intercâmbio escolar.
 Meu coração latejou inquieto escorando-se numa sozinhez iminente. Há quatro meses o câncer havia levado o pai dela e a gente ainda vivia o processo dolorido da ausência, do choro no meio da noite e de sentir o cheiro dele em todos os cantos da casa. Depositei meu olhar no portal da cozinha enquanto ela lavava a louça e falava do Cabo das Tormentas e da janelinha por onde Mandela via o por do sol quando ficou preso na ilha.
Permaneci avulsa cobiçando a plenitude dos felizes. Pensando num jeito de arranjar forças para não morrer de chorar no dia que ela viajasse. Na semana seguinte fui buscar compreensão para a providência dos detalhes. Esmiucei tudo. Tintin-por-tintin. Maternagem e cautela. Consulta financeira, médica, odontológica e outros aportes geradores de cuidados.
Que lindo aquele riso solto dela. Aquela alegriazinha lagrimada de vagalume que brilha mesmo quando a  noite é seca. “O tempo pode ser de aço, filha, mas pontas de sublimes ainda enfeitam nossa janela”. Afirmei consumada e fui ajuda-la com as roupas de inverno.
Fez frio no dia do embarque e um dilúvio represou meus olhos. Almoçamos juntas sem palavras para evitar outras lágrimas. Mais tarde enlaçadas num abraço de amor trocamos promessa de cuidados diários.
“Chorar faz bem. Feiura é não saber usar Skype”. Era uma provocação amorosa. Tenho pouca habilidade com tecnologias e estava aprendendo a utilizar a ferramenta que ela instalou a pouco no aparelho celular recém-comprado.
A internet facilitou tudo e eu cavouquei mais trabalho para espantar a solidão dos dias calmos. Os amigos vieram feitos sol, feito amor divino. Brindaram comigo o eterno e o célere, a foto e o poema, o soneto e o salmo.
Água com flor de hortelã, bolo prestígio, canja de galinha, café amargo com manteiga da terra no pão bem tostadinho. Feijoada, licor de araçá e uma antiga cantiga tocada por um desses anjos líricos no meio da sala “somos todos irmãos da lua moramos na mesma rua”.
 Deus é bom. A saudade é que é danada e vive a traquejar minha alma. Todo dia no meio da tarde nos falamos via Skype. Meu coração se apronta todo para espera-la. Fica corado, florido por gratidão e milagres. Num rebuliço santo se repete animado: Brisa, eu te amo!


domingo, 5 de julho de 2015

Havia pouco para dizer.
Era a primeira vez que me habitava aquela sentimentalidade.
Nos abraçamos bem rente. Nos olhamos nos olhos e afagamos os cabelos.
Eu com todo estoque de amor materno.
Ela com todo cuidado de única filha amorosa.
Entregou-me o potinho com pão de queijo.
Entreguei-lhe o casaco de lã grossa.
Bendisse o amor de Deus nas nossas vidas e soluçosas nos prometemos notícias diariamente.
O coração dela "é todo certeza" e o meu um bandolim feliz e agitado.
Contínuo e alegre esperante cativo de sua chegada. 

quinta-feira, 2 de julho de 2015

A casa está sonora de novo. 
Sem quê nem mais a aparelhagem antiga parou com todos os bemóis e sustenidos.
Oswaldo Jr. veio com maleta e martelo. Chavinhou convencido cada partitura, removeu parafuso e cuidou dos fios desconciliados. 
Assoprou com afinco tudo que alteava silêncio e botou até o toca-disco velho pra funcionar.
Assistimos com devoção seu empenho domingueiro. Beirava lirismo sua vontade de conserto.
Parceria fraterna que só nasce na alma dos que Granjearam o mesmo Jardim.
Oh, Boy!
Bem que Poeta dizia: "Tu és cabra de responsa, Homi"!
Agora com o som ligado eu escuto os sentidos de outrora e pareço uma zabelê que a noite deu à luz por engano.Cheiro, de bons sentimentos em TODOS.

quinta-feira, 11 de junho de 2015


Até que chegue amanhã eu penso em ti, irmão meu.
Penso em ti com a força que colore os abrigos mais seguros.
Penso em ti com o silêncio dos morros e com as inquietações remexidas dos que deram certo.
Penso em ti como se os sábados de nossa infância fossem ontem de tardezinha e nossa exclamação infante ainda ressoasse na várzea pelo grande peixe que apanhamos com a tarrafinha do pai. - Uma tilapiazinha sem interesse de tamanho mediano nos botando exultação marítima! -
Até que chegue amanhã eu penso em ti, meu irmão.
Um dia entenderás que Deus mandou o cordeiro e por isso o cutelo não foi usado.
No rio de nossa infância cessaram os peixes e as malvinhas da cerca não se encrespam mais pela presença do capim gordura.
O tempo não é de boas notícias, mas basta pensar em vocês que volto à doçura das fontes, a multiplicação dos pães, e aquele refrão tão conhecido: 
“tudo em volta é só beleza.” 
Isso ameniza e muito, as faltas do meu arcabouço.
Beijos em todos. Dormente de amor.

domingo, 31 de maio de 2015


Olhos cravejados de sentidos
assopram a neblina em revoada
antes era sonho sem fim
de cada lado
hoje vidraça com desenhos molhados
querubins, sonetos, odes e lira
Já vai para um ano
e eu ainda não consigo escutar Vander Lee

“você  é  primavera no final de maio”.

sábado, 23 de maio de 2015

(Pelo início das obras de restauração do Cine Teatro Benedito Alves da Silva, SJC).
“Era em São José dos Campos
o horizonte estava perto e
tudo parecia certo
admiravelmente certo”. - mas já existiu um tempo -

não tão bem certo assim
que me perdoe Cassiano 
a cidade do Poeta
assistiu por muitos anos
nosso teatro fechado
e se deteriorando.

Logo ele o Benedito
patrimônio cultural
paisagístico e histórico
relevância sem igual
referência para artistas
espaço tradicional

Quanta arte apresentada
nesse palco nesse chão
espetáculos, cantorias,
filmes, recitais, baião
Morte e Vida Severina
com sotaque do sertão

O fechamento nos trouxe
a inversão dos valores
apelamos pro Prefeito
e para os vereadores
os gestores culturais
também ouviam os clamores

Foi feito documentário
entrevistas, petição
vigília em frente ao Teatro
cantiga e declamação 
mantivemos a esperança
acesa com devoção

Recebemos com aplauso 
a lei da preservação
depois vimos com tristeza 
o veto à manutenção
oh Prefeito insensível 
oh homem sem coração!

Quando se espalhou notícia
de uma terceirização
os ânimos se acirraram
por essa contradição
restaurante? pizzaria?
vai ter briga de facão

Os direitos a cultura 
é um dever do estado 
como efetivar acesso
com um teatro fechado?
e o outro lá invertido?
Oh tempo descompensado!

Finalmente a boa nova
restauro e preservação
espetáculos teatrais
dança poema e canção
projeção de filme e artes
cultura sem restrição

Gente linda e importante
Deus é bom povo bonito
aplauso pros que lutaram
São José, nem acredito!
viva a arte e a cultura
Viva o nosso Benedito!

Peguei a foto emprestada no site da FCCR.

domingo, 5 de abril de 2015

                                                Foto Pib Sjcampos.
                                               
Ele andou sobre as águas. Dançou com as moças de sua comunidade. Era dado aos vinhos e fazia discursos bons de ouvir. Chicoteou mercadores e deu carão em Pedro, chorou de agonia e tremeu de medo.
Devia ter mal hálito e unha encravada. Talvez roncasse e assuasse o nariz de modo estranho.
Seus vizinhos não botavam fé nem achavam graça nas suas feituras, mas ele curou um cego que gritava seu nome desesperadamente, fez viver o filho da viúva que morava em Naim, Lázaro e a filha de Jairo.
Talvez não soubesse nada de carpintaria. Talvez tivesse feito com pedaços de ripa seus primeiros brinquedos. Talvez gostasse do cheiro da madeira ou nunca pegasse no martelo.
Talvez escrevesse sonetos e os declamasse para suas preferidas. Isso de certo a gente nunca vai saber.
Sabemos que era um galileu bronzeado e eloquente. Falava com a autoridade própria dos sábios e com a humildade de uma criancinha amável. Foi pregado no madeiro, mas vive.
Sei que ele andou comigo pelo vale da sombra quando a morte passou pela minha vida. Acudiu-me nos dias de infinita dor e desesperança. Nos latejos da penúria quando gigantes se enfileiravam para jogar setas em minha tenda ele esteve comigo. Nas noites de saudade impune e chororô no travesseiro ele vem e permanece em silêncio e passivo.
Quando fiquei mais precária e trêmula ele passeou comigo. Ensinou-me sobre desertos e na secura mais alta retirou do seu odre a melhor água e me hidratou.
Quando adoeci de ausência ele apareceu desencurvando minhas têmporas, devolvendo o riso que escapara pelas brechas da telha. Incentivou-me a ligar o rádio e plantar hortaliças. Apontava para um letreiro brilhante e invisível onde cabia o nome da Brisa, dos irmãos, mãe, familiares e todos os amigos. E só de ver aqueles nomes eu começava a existir diferente. Recorria ao esmero de seus abraços e tudo ganhava cor e sentido.
Meu ajudador, santo prudente, homem histórico e destemido venceu a morte e a fraqueza dos dias de desassossego.
Permanece ao meu lado gerando justas sentenças, provisão e amor sem cotas. Continua alinhando meus planos na beirada das noites e na aurora de cada manhã. Nem em sonho repousa. E se não fosse a certeza que ele me guarda, vigia e protege com o afinco dos famintos que espera a mesa posta, sinceramente não sei, não sei o que seria de mim.
Um cheiro de bem querer em TODOS.
Feliz domingo de Amor comprometido.


quarta-feira, 1 de abril de 2015

                                          arte Rodolfo Morales




“Uma força que nos alerta”

  ...Maria não vai com as outras. Vai sozinha. Mulher sem queixumes, sem lamentações, ou lenga-lenga. Ela não perde o prumo pelo latido dos cachorros do vizinho em frente. Não publica desafeto nem palavras vãs. Não ignora Paulo Freire e raramente aparece na rede social. Maria desce sozinha a ladeira das considerações e desenterra os sonhos no garimpo das causas sem esperança. Acende o candeeiro e ilumina pequeninos pódios. Traça rotas e pega a corda que enlaça arco-íris com a força nova das promessas que divinamente gotejam. Borda estrelinhas sonolentas na parede e abre as portas que desativam o silêncio, o marasmo, a mesmice, o cheiro das coisas com bolor. Quando aperta ela também chora. Acorda sempre cedo para atestar o grau que transforma as práticas salobras em requisitos nobres. Ignora a marcha dos contrários. O “mi-mi-mi” dos incrédulos e a arte dos que se auto enganam cotidianamente. Engajou-se na afoiteza do simples e arranjou tempo para brincar de roda, dançar com anjos e soltar pandorgas no riso mais alto. Somou princípios e ensina as crianças e adultos a recitarem a oração da permanência. Compra tijolos, levanta paredes. Reparte o pão, o azeite, o bálsamo, o confeito, a cesta com flores de papel - que ela mesma faz. – Imita a Dorcas e transforma xales em lenços que enfrentam medos. Anda fazendo tanta poesia que não dar conta de mensurar, de imprimir, de publicar. Poesia viva que estala os dedos e coça o nariz, leva topada, pega resfriado e espirra com os borrifos da poeira da estradinha amarela. Fez a soma de tudo que necessita para compor a tenda das celebrações e decidiu desentulhar o poço. Cavouca daqui, espreme de lá, percebeu que ainda falta muito. Faltam arandelas para enfeitar o sol, placas divisórias para cuidar das brechas. Falta tinta para botar cor na brancura dos cânticos e o piso para proteger a área externa. Faltam livros e Bíblias, mas ela sabe que o amor é um rio cheio e cristalino e jamais esse rio vai negar água a quem sempre afogou as adversidades de seus pares com gotas de alegria, bondade natural e porções de esperança do verbo esperançar.

*Maria existe. Tem olhos clarinhos e uma alma boa que transborda.

terça-feira, 17 de março de 2015


Embrulhei tua fala num mosaico verde bem placidozinho
prendi na proa do navio de ouro e alcancei o mar
nas espumas quase silenciosas pintei teu rosto 
nos corais e estrelas salpiquei tuas nuvens e formigas
no hissopo das pedras preguei tuas margens 
mas veio a noite
com suas safiras gementes e conchas sem pérolas
despejou seus detalhes e a lembrança do teu sono eterno
retornei como sal
sentenciada a escassez das dunas leves...



"eu não sabia que doía tanto 
uma mesa num canto,
uma casa,
um jardim"...











quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Tem coisas melhor que férias? Tem nada.
Este ano ao contrário de todos os anteriores eu e Brisa resolvemos ficar bem quietinhas no mormaço de nossa palhoça. Nada de saracoteios por veredas que nos botam lembranças. Uma passeadinha em Curitiba e sossego no máximo nos demais dias. Como o joelho esquerdo deu de ficar desmantelado e a orientação médica era repouso completo. Livrei-me de todas as fazeduras de trabalho. Preferi o balanço na rede, comidinha fresca, peixe com pirão. Passeios só pra botar água no pé de caqui que está bem afoito plantado na encosta da grota lá para as bandas da casa da Angela Tuti
De resto foi só leituras, cochilo nas tardes, filmes, conversinhas demoradas com os amigos ao telefone, paródias e risadas com Brisa.
Num desses dias uma amiga fez convite para eu participar de um evento em família e cantar uma cantiga daquelas "simprinha". Brisa disse não. “Não, mãe! PelamordeDeus”.
Puxei o senso dos critérios. - Filho sempre conhece nossa condição- mas com pontas de esperanças no vão dos olhos fiz essa rimazinha.
Ela diz: “Cantiga não
é melhor tu declamar
um poema bem bonito
desses que fala de mar
de saudade, de partilha
de alegria, vigília
ou um cordel popular”.
Sou manquetola eu bem sei
pareço taboca fanha
piabinha enfraquecida
beliscada por piranha
mas sei cantar direitinho
Elpidio, Elba, Oswaldinho
Leo Mandi, Chico e Bethania
Deixe eu cantar filha minha
deixe eu cantar que prometo
comprar na feira de sábado
um bom livro de soneto
quebra- queixo e paçoca
manga, peixe, tapioca
grão de bico e feijão preto.
Ela não deixou. Mas é toda amor. Acabaram-se as férias e daqui a pouco
o mundo cai de cansaço. Beijos e abraços de ternura antiga, em todos.

sábado, 3 de janeiro de 2015

No vão dos olhos tem uma nuvem
que dia sim 
dia não 
ameaça encher o mar 
com o azul da tua falta...