domingo, 21 de outubro de 2012




Meu pai agreste se foi bem cedo.
Minha mãe sem aceitar meus cachos recitou lindamente Vinicius de Moraes e Patativa do Assaré, benzeu-me a testa para aliviar cicatrizes.
Minha irmã bem sucedida na sua consultoria de modas continua ajeitando-me com seus xales finos e camisas de carestia.Quando se descuida eu a engabelo e volto para minhas estampas florais e brincos de capim-dourado. Guardo os xales e as camisas na gaveta forrada com papel de presente.
Meu irmão psicanalista clínico é meu escutador. Recomenda-me Lacan e como bom poeta que é já aceitou minha incur
ável doença de cavoucar palavras.
Minha cunhada Ph.D. em enfermagem também acode-me preparando dieta baixa em calorias e rica em abraços e fibras de açulos. Meu outro irmão chama a florista e a amiga fiel para as confidências. Minha filha complementa os ritos. Participa da migração e brandura outonal do vento para me favorecer com as nuvens. Meu amor prepara réquiens e bastante papel. Ele sabe que nesses dias “é brabo” e eu dou nos nervos. Viro um sol lembrativo de urgência própria. Há muito ele conhece meu cativeiro de saudade e prepara a mesa, cuida do peixe, considera as frutas. Espia-me encher uma taça de vinho demi-seco, sentar-me no batente da porta do meio para cantar: “ê, ê, ê Vaca Estrela! Ô, ô, ô Boi Fubá”...

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