terça-feira, 10 de julho de 2012
Graciosa a tarde de sábado nem boceja, chega pronta e sonora. Com cheiro de serra, queijadinha e pão de queijo.
Estamos em quatro e fala-se de política, amores, decotes, filhos, literatura, ciúmes, flores e outras coisinhas que encandecem.
Um escambo de livros é realizado em plena via Dutra. Eu fico com Os Últimos Dias de Baudelaire, Sônia Gabriel prefere o Ciranda dos Tempos, da Beth Brait, Pércila desiste de um filósofo que fala sobre Os Malefícios do Amor e Dyrce é a detentora da sacola cheia de exemplares.
Nosso ponto de parada é o Espaço Cultural “Projeto Fazendo Arte” em Tremembé. Conceição Molinaro, nossa anfitriã, nos espera na calçada, sob o trinar gotejado de papagaios-da-floresta ou gangarras como também são chamados. Com maestria, eles se aprumam nos galhos mais altos da árvore centenária, que fica em frente à casa de Artes.
Crianças, jovens e adultos participam de diversas atividades educativas socioculturais; música, dança, artes plásticas, literatura. Seiscentos alunos e um temor: A mudança do poder executivo na Municipalidade. Nestes tempos de eleição, tudo pode ocorrer, inclusive a desimportância para com projetos como este que a Conceição idealizou e pratica.
Tomadas pela afetividade da acolhida, fomos levadas por impensáveis delícias, advindas de quem conhece os teares da delicadeza, dos gestos solidários e da humildade. De quem não suspende os acordes da arte-cultura e fez do Vale um pouso fixo e bonito de ver.
Um micro-ônibus nos leva pela estradinha bucólica. Enquanto Conceição segue contando a história dos Monges Trapistas, dos campos de arroz que se vestem de dourado na época da colheita. Passamos pela ponte de ferro que corta o ressono do Rio Paraíba. Paramos na igreja do Berisal. Nossa Senhora do Berisal, uma graça, cercada de anjos, de galinhas poedeiras, maracujás madurando na cerquinha viva de madeira em flor.
Pausa para foto e para ouvir mais histórias do Mosteiro, contadas pelo moço que conserta telhados cujo nome esqueci de perguntar.
Nosso passeio, de tão prazeroso e rico, mais parecia antecipação de céu. Na bica da Água Santa, pensei na Brisa e desejei que ela estivesse comigo. Na igreja do Bom Jesus, apreciei as esculturas lindas do apóstolo Pedro, com suas chaves recostadas ao peito e do preferido de Jesus, João, com sua espada a proteger a praça, as crianças e o carrinho de pipoca.
Não resisti e falei para a moça pipoqueira: - Quero o maior e sem queijo, por favor. Ela segurou os dois reais, entregando-me o saco de pipoca com um sorriso mais cheio de tempo do mundo. Comemos felizes eu, Dyrce e Sônia que também fotografava a porteirinha do casarão vizinho à igreja, bordado de azul e branco, dormentes repleto de estátuas.
Deus é mesmo muito acessível eu pensava chorando, enquanto ouvia a orquestra. Maestro Levi cheio de ritmos e cuidados conduzia aqueles jovens por caminhos decifráveis, enfeitando cada pausa com uma emoção que nos levava ao infinito.
Aqueles jovens não serão apreciadores de pancadões. Não serão molestadores de escrúpulos alheios. Serão multiplicadores, estimularão a comunidade para o fortalecimento do protagonismo, empoderamento e emancipação socioeducativa e cultural. Pena que os representantes do poder não conseguem enxergar essa importância. Meus pensamentos não se calavam.
Depois da musica, fomos para um salão lindo, com espelhos largos. A mesa repletinha de culpa e delícias: toalha rendada de alvura ímpar, bolo de cenoura com cobertura de chocolate amargo, bolo de fubá cremoso, chazinho de diversos sabores, café passado naquela horinha. Suco de maracujá, pão de queijo, biscoitinho de manjar, flores e água.
Começou uma conversa animada, histórias de vidas, planos, lágrimas, presentes trocados na hora da saída. Mulheres com suas rimas e sonhos, entusiasmos, cheiros, encantos, desejos e sensação de borboleta colorida. Que venham outras tardes daquela com Dalilas e Querubins. Metáforas, identificações, estradinha de terra e esboços de bom futuro.
Sobre o som da espera, Conceição, estamos aqui, com a casa e alma aberta para você e os teus. Venha, viu?
*Todas as fotos foram tiradas pela Sônia Gabriel.
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