sábado, 15 de fevereiro de 2014




Hoje minha Trincheira acordou mais silenciosa, mais completa de vazio. Ele que foi o líder mais respeitado da comunidade, que nos viu pequeninos e nos aconselhou com seus modos paternos. Ele que era defensor dos fracos, defensor da terra, das águas. Incansável ajudador de todos cansou-se de esperar a chuva demoradeira e foi se encontrar com sua amada Lita.
Ele que me encomendou tantas cartas para seu filho Antônio, conheceu São Paulo e morou em Guarulhos. Por muito tempo só usava calças UStop. Uma chiqueza pra roça!
Nos finais de semana eu sempre ligava para saber como estava. Ultimamente estava mais reclamão, saúde afracada, aperreava-se com o calor que sempre foi nosso. Em janeiro nos abraçamos pela última vez. Disse-me que o cansaço lhe vencia inteiro, talvez não aguentasse a compridez do tempo. Apertei sua mão e lhe acarinhei a cabeleira prateada. Sentei-me na soleira da porta como fazia quando era menina. Perguntou-me da saúde do Poeta e mandou-nos perseverar. Disse que Deus é bom e nunca desampara seus filhos amados. Eu disse amém. Ele ficou calado. Sua voz era terna e um pouquinho rouca devido às dezenas de anos em tragos, mas suas palavras tinham a clareza dos satélites raros. Não bebia café, ainda fumava e tinha mania de cuspir no chão, para o lado de lá da calçada. Quando as cisternas das casas estavam beirando a metade, ele convocava os responsáveis municipais e rapidamente os carros pipas eram enviados. Ele cuidava dos reparos em todos os detalhes; energia elétrica, telefonia rural, agentes de saúde, eleição e outros recados. Conhecia todos e chamava cada um pelo seu nome ou apelido.
Foi um mestre. Um sabedor popular. Um incansável buscador de melhorias rural. Um bonito anjo idoso que atendeu o chamado celeste e viajou colorido e íntegro. Satisfeito e tímido. Deixando a rede e a cadeira de balanço na sala deserta. Ambas pendidas, descompensadas e esvaziadas de riso.
Osmundo Amâncio de Morais as vezes esqueço "que a gente é feito para acabar" e dou de doer e dou de chorar...

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Quando apareceu a terceira matiz tumoral ofuscou meu sobre, meu quando, minha cantiga de  resolver agudos.  Entre céu e cactus andei sonâmbula e descalça procurando esmero para habituar-me as exigências da novidade. Nas cores de cada tarde conheci a urgência de se ter esperança, fé e bom ânimo.  Conheci o grande sol que pendia na barra do desconhecido e as primícias dos aromas que atarantam. Conheci também as flores de Deus; nítidas, plácidas, confiosas e trescalantes. Em especial  conheci  um futuro de serenidade conseguido pela coragem de  aceitar o que se passava. Oito meses se foram. Quase tudo em nossa vida mudou ou foi adaptado para as considerações da realidade. O tratamento convencional; farmacológico e quimioterápico estão sendo mantidos com rigor e assim será. O nutricional, suplementar e espiritual dentre outros afetos, tem sido suprassumo de boas garantias e surpresas. Por consenso médico não haverá cirurgia neste semestre, mas ainda assim estamos felizes pela certeza da bem aventurança e cuidados. Continuarei ao lado dele,  amiúde, vigilante, ocupada,  grudada feito virose amorosa. Repleta de fé e desejando saúde continuarei. Continuarei recolhendo o elixir das auroras, esperando em Deus o momento de tirar todo o vestígio de câncer da cabine dos nossos olhos.
Um beijo em TODOS!
Estamos bem, felizes e bem.
Gratidão sem cotas, por TUDO.