sexta-feira, 31 de julho de 2015



Disse sim para o que a razão recomenda numa tarde de sábado quando ela me apresentou o desejo de viajar à África do Sul no intercâmbio escolar.
 Meu coração latejou inquieto escorando-se numa sozinhez iminente. Há quatro meses o câncer havia levado o pai dela e a gente ainda vivia o processo dolorido da ausência, do choro no meio da noite e de sentir o cheiro dele em todos os cantos da casa. Depositei meu olhar no portal da cozinha enquanto ela lavava a louça e falava do Cabo das Tormentas e da janelinha por onde Mandela via o por do sol quando ficou preso na ilha.
Permaneci avulsa cobiçando a plenitude dos felizes. Pensando num jeito de arranjar forças para não morrer de chorar no dia que ela viajasse. Na semana seguinte fui buscar compreensão para a providência dos detalhes. Esmiucei tudo. Tintin-por-tintin. Maternagem e cautela. Consulta financeira, médica, odontológica e outros aportes geradores de cuidados.
Que lindo aquele riso solto dela. Aquela alegriazinha lagrimada de vagalume que brilha mesmo quando a  noite é seca. “O tempo pode ser de aço, filha, mas pontas de sublimes ainda enfeitam nossa janela”. Afirmei consumada e fui ajuda-la com as roupas de inverno.
Fez frio no dia do embarque e um dilúvio represou meus olhos. Almoçamos juntas sem palavras para evitar outras lágrimas. Mais tarde enlaçadas num abraço de amor trocamos promessa de cuidados diários.
“Chorar faz bem. Feiura é não saber usar Skype”. Era uma provocação amorosa. Tenho pouca habilidade com tecnologias e estava aprendendo a utilizar a ferramenta que ela instalou a pouco no aparelho celular recém-comprado.
A internet facilitou tudo e eu cavouquei mais trabalho para espantar a solidão dos dias calmos. Os amigos vieram feitos sol, feito amor divino. Brindaram comigo o eterno e o célere, a foto e o poema, o soneto e o salmo.
Água com flor de hortelã, bolo prestígio, canja de galinha, café amargo com manteiga da terra no pão bem tostadinho. Feijoada, licor de araçá e uma antiga cantiga tocada por um desses anjos líricos no meio da sala “somos todos irmãos da lua moramos na mesma rua”.
 Deus é bom. A saudade é que é danada e vive a traquejar minha alma. Todo dia no meio da tarde nos falamos via Skype. Meu coração se apronta todo para espera-la. Fica corado, florido por gratidão e milagres. Num rebuliço santo se repete animado: Brisa, eu te amo!


domingo, 5 de julho de 2015

Havia pouco para dizer.
Era a primeira vez que me habitava aquela sentimentalidade.
Nos abraçamos bem rente. Nos olhamos nos olhos e afagamos os cabelos.
Eu com todo estoque de amor materno.
Ela com todo cuidado de única filha amorosa.
Entregou-me o potinho com pão de queijo.
Entreguei-lhe o casaco de lã grossa.
Bendisse o amor de Deus nas nossas vidas e soluçosas nos prometemos notícias diariamente.
O coração dela "é todo certeza" e o meu um bandolim feliz e agitado.
Contínuo e alegre esperante cativo de sua chegada. 

quinta-feira, 2 de julho de 2015

A casa está sonora de novo. 
Sem quê nem mais a aparelhagem antiga parou com todos os bemóis e sustenidos.
Oswaldo Jr. veio com maleta e martelo. Chavinhou convencido cada partitura, removeu parafuso e cuidou dos fios desconciliados. 
Assoprou com afinco tudo que alteava silêncio e botou até o toca-disco velho pra funcionar.
Assistimos com devoção seu empenho domingueiro. Beirava lirismo sua vontade de conserto.
Parceria fraterna que só nasce na alma dos que Granjearam o mesmo Jardim.
Oh, Boy!
Bem que Poeta dizia: "Tu és cabra de responsa, Homi"!
Agora com o som ligado eu escuto os sentidos de outrora e pareço uma zabelê que a noite deu à luz por engano.Cheiro, de bons sentimentos em TODOS.